Neste
mês que o blog “Permaculturando com Arte” está fazendo aniversário, registro
aqui minhas considerações e balanço de primeiro ano prático do Projeto “Estância
dos Portais”. Depois de algumas postagens dispersas acerca do passo a passo do
projeto, ideias, inspirações, um primeiro esboço do que seria o projeto, os
jardins e o design, partilho aqui a dificuldade maior. Talvez seja essa a maior
que encontrei desde a idealização até o presente dia que lhes escrevo: o caseiro.
Andei
em busca de um caseiro que partilhasse os mesmos ideais e conseguisse
sobreviver às primeiras dificuldades enquanto melhorasse a infraestrutura para
abrigar a ele e a sua família.
Em
07/2006 contratei o Primeiro caseiro.
Um peão de rodeio. Peão de rodeio é um universo que eu diria antiambientalista.
Pela experiência da lida com gado, achei que poderia cuidar das únicas duas
vaquinhas de leite que estão em fazendas de conhecidos à espera que eu vá
buscá-las. O que ainda não aconteceu. Vaquinhas por conta do leite orgânico que
pretendo oferecer na estância. Cinco meses e dez dias. Levo Primeiro caseiro de
manhã e busco à tarde: às 15 horas. Dorme na cidade. Mulher e crianças ficam na
cidade de inicio. Primeiro Caseiro se envolve com amante, e acaba assassinando-a
a facadas. Consegue uma sentença de 28 anos de prisão e alguns meses.
Em
01/2010 arrisco a contratação do Segundo
Caseiro. O marido de senhora que conheci no hospital. Povo pobre,
humilde. Vive pedindo nas rádios da
cidade. Pensei: essa gente merece ser ajudada. Pobre gente! Contratado.
Carteira registrada, FGTS, férias, 13 terceiro, salário. Mulher de Segundo
Caseiro tem oito filhas mulheres. Rumores de que ela alicia meninas para homens
da cidade e envolvimento com conselho tutelar. E ele se embriagava
constantemente e além de fumar, havia ameaças de vender minhas ferramentas e
bujão de gás para compra de maconha. Um mês e dez dias.
Em
04/2010 arrisco Terceiro Caseiro:
Menino educado, jovem que diz ter experiência na roça. Muito boa gente, porém
no balanço de um mês de contrato somou doze dias na roça e dezoito na cidade.
Segundo mês, oito dias na roça e vinte e dois na cidade.Dois meses.
Em
07/2010 arrisco Quarto Caseiro. Paraíba.
Casal até bonito, mulher índia vinda do Pará dos cabarés da vida. Ele, jagunço
com ficha na polícia. Duas crianças que são somente dela. “Criança com fome,
dona. Fico pela comida”. Homem que não olha nos olhos. E quando o fogo ameaça a
chácara... Tem nada, não! O fogo é pra
matar as cobras! Se mexer com a patroa, destripo
o bucho na peixeira!” – Preciso de guarda costa, não! Só preciso de um caseiro!
Índia que todas as quintas eu ia buscar pra lavar roupa na cidade. Lavava roupa
no rio não. Tinha medo de cobra. Paraíba dizia: “tem um serrador que serra de
noite, Patroa, ele serra aqui, serra mais acolá, serra a noite inteira”. _Será
que tem gente da carvoaria tirando minha lenha às escondidas? _“É coisa desse
mundo não, Patroa! É “livusia”. Dois meses. Arranjei passagem pra Paraíba e
botei no ônibus.
Em
06/2011 arrisco Quinto Caseiro:
Quilombola. Pensei: descendente de escravo trabalha a terra. Caseiro vai de
bicicleta primeiros meses e volta 15:00 horas. Família fica na cidade. Caseiro
vai e volta 10:00 hrs da manhã pra
almoçar em casa. Caseiro vai segunda feira e falha terça. Caseiro vai somente
segunda- feira na semana.” Foi lá hoje?
Não! já fui lá no começo da semana”! Parei o carro na estrada de chão pra deixar
passar Sua Excelência, um Tatú, que não consegui distinguir se era
tatu-verdadeiro ou tatu-peba..._”Rapaz, como é que não trouxe ele prá fazer uma
farofa!” – Mas, Caseiro, se aqui é uma reserva ecológica, um projeto ambiental,
como é que não damos o exemplo?!” – Há, não! Escolhe: ou eu ou o Tatú! Se
passar na minha frente, “traço” mesmo!” Rescisão! Férias, 13º. Fgts, salário e
abono família... Multa rescisória e seguro desemprego! Dez meses. Jurei que antes da contratação de um próximo
caseiro me internaria no hospício.
Em
03/2013, Primo quis morar lá com a família. Mulher gravidinha e filhinho de
quatro anos. Primo pedreiro que não faço referencia a Sexto Caseiro. “Não funciona! Lá a vida é de índio. Não tenho
energia elétrica ainda, água no rio fica a 300 metros”. Primo alegre, cabeça
aberta, capoeirista, entusiasmado. Pensei: vida nova ao sítio. Quem sabe incluo
ele nos programas culturais do projeto com os eventos de capoeira? Fiquei
feliz. Primo ficou um mês e dez dias.
Mesmo eu viajando duas vezes no dia, doze quilômetros pra levar assistência,
comida, remédio, água da torneira pra colocar no filtro, levar e buscar, ainda
assim, Primo reclamou da solidão e da falta de condução. Mesmo os amigos indo
todos os finais de semana tomar banho de rio e churrasquear e a faze-lhes companhia. E mesmo carros indo e
vindo o dia inteiro para as chácaras vizinhas. Primo levantou acampamento, veio
embora.
Análise de balanço: entre 2006 e 2013, com todas essas seis experiências, o gasto financeiro com despesas diretas e indiretas daria pra levantar toda a estrutura do projeto. Assim, cresceu-se toda a vegetação que foi capinada, roçada e podada. Tudo que foi feito terá que se refazer. Pois a natureza, sábia e poderosa, faz brotar as raízes e regenerar-se graças a Deus!
Análise de balanço: entre 2006 e 2013, com todas essas seis experiências, o gasto financeiro com despesas diretas e indiretas daria pra levantar toda a estrutura do projeto. Assim, cresceu-se toda a vegetação que foi capinada, roçada e podada. Tudo que foi feito terá que se refazer. Pois a natureza, sábia e poderosa, faz brotar as raízes e regenerar-se graças a Deus!
Agora
enfezei! Vou trabalhar no sistema de
MUTIRÃO! Arrumo uns cinco peões pra o serviço braçal, pago a diária e fica
tudo certo. Precisei de oito anos pra conscientizar que contratar caseiro não funciona. Será que fui boazinha demais?